- Introdução- Sou Rodrigo Silva, fotógrafo paulistano e desde sempre um grande fã de imagens panorâmicas, que dão um visual cinematográfico a fotografia. A alguns anos notei a existência da Hasselblad Xpan/Fuji TX e fiquei apaixonado, já que câmeras rangefinder são minhas favoritas ela me parecia perfeita. A partir daí comecei a acompanhar a subida estratosféricas dos preços a cada novo vídeo no YouTube falando o quanto incrível era esta câmera. Em um momento financeiro um pouco melhor quase comprei uma por 6 mil mas mas acabei desistindo por conta do meu medo de câmeras eletrônicas que se param de funcionar dificilmente teria chance de reparo. Atualmente uma dessas com lente 45mm não sairia por menos de 12 a 15 mil e com isso totalmente fora do meu alcance. A partir daí comecei a me concentrar nas alternativas para fazer panorâmicas 35mmm e isso virou quase um hobbie a parte pois eu tentei e tive resultados legais em várias câmeras médio formato. Pentax 6x7
Zeiss Ikonta
Fujifilm GW690III
Esta última foi importada do Japão já com esta ideia em mente e usei com filme 120 muito pouco. Pelo fato de ser rangefinder acho que foi o mais próximo que consegui chegar de uma Xpan. Tive bons resultados, mas apesar de relativamente leve ainda é uma câmera meio grande e depende dos adaptadores para filme 35mm. Depois disso fiquei bastante intrigado por modelos feitos com impressão 3D principalmente a Oxygen de Oscar Oweson e Brancopan de Ethan Moses. *(Ambas agora com arquivos disponíveis gratuitamente). Na época eu ainda não tinha e nem pensava em comprar uma impressora 3D pois acreditava ser algo bem caro. O tempo passa e com a decreto de quarentena em São Paulo devido a pandemia de Covid-19 eu resolvo olhar preços de impressoras, já que o período de isolamento seria uma boa oportunidade para começar a aprender algo novo. No fim descobri que uma impressora chinesa simples custa menos de 2 mil reais e mesmo sem dinheiro resolvi comprar parcelado em 12x no cartão haha Bom eu posso dizer que foi a melhor coisa que poderia ter feito este ano, sem trabalho e com a possibilidade de sair bem limitada foi um bom passatempo para distrair a mente. Comecei imprimindo os cubos de calibragem e várias tranqueirinhas do Thingiverse, e até cheguei a construir a minha Dora Goodman ZONE, mas fica claro que sem saber desenhar em software 3D eu não conseguiria realizar projetos meus. Sem nunca ter desenhado nada o meu primeiro projeto foi um adaptador para usar backs RB67 na Mamiya Press e apesar de alguns erros funcionou. Na sequência com a grande ajuda de aulas no YouTube fui aprendendo um pouco mais e hoje com apenas meu paquímetro digital de 60 reais do ML já consigo desenhar algumas peças relativamente complexas. É neste período que no intervalo de uma semana vejo dois projetos de conversão de cameras 35mm para panoramas no grupo Hand Made Film Camera. e isso finalmente foi a inspiração para tentar um projeto meu pois pela primeira vez estava vendo o emprego de impressão 3D e não trabalhos com metais, solda e tornos que é algo que não tenho conhecimento ou acesso. -O Projeto-
Acredito que para qualquer projeto similar a escolha deve começar pela lente a ser usada e todo o resto construído em volta disso. O ideal seria uma lente grande formato 47mm mas elas são extremamente raras por aqui e relativamente caras no mercado internacional. Eu optei por usar uma Mamiya C330 65mm (6x6) que para o formato panorâmico teria um campo de visão aproximado de 32mm.
Testei ela montada na minha Toyo 4x5 e o círculo de imagem com foco no infinito é pouco mais de 80mm o que dá e sobra para este projeto.
As opções são meio limitadas pois precisa ser angular e com ao menos obturador integrado.
A primeira lente que comprei no estado por um preço bom infelizmente está com haze nos elementos frontais o que impede o uso mas serve para o projeto.
O próximo passo foi pensar em uma solução para a helicoide para fazer o foco. Existem no ebay prontas em vários diâmetros, mas como eu tinha aqui uma sucata de uma lente 28mm genérica e achei que seria suficiente.
Para unir esses dois componentes precisei desenhar uma peça que de um lado teria a rosca do retainer (32.5x0.5) e do outro uma aba para fixar na helicóide. Após vários dias eu finalmente consegui, para quem não sabe é possível imprimir roscas mas acertar os parâmetros e tolerâncias é algo complicado que demanda muita tentativa e erro. Nesta fase também desenhei um parasol simples usando a função “Loft” do Fusion 360, algo que tinha acabado de aprender. Depois disso não teria mais o que fazer até achar um corpo doador para o projeto e neste quesito tive uma certa dificuldade, a princípio pensei em usar uma Zenit que tenho aqui mais logo descobri, algo que nunca tinha prestado atenção, que é a extensão do trilho onde o filme 35mm passa. Para algo que considero “panorâmico” eu precisaria de no mínimo 68mm o que é impossível na maioria das câmeras SLR exceto as Nikons. Outra alternativa seria uma Nimslo (câmera 3d) mas esta anda super hypada e mesmo que encontrasse uma sucata por aqui custaria muito caro. Do corpo doador eu preciso apenas da “caixa escura” e transporte do filme, todo o resto seria descartado.
Então começa a busca por um corpo de Nikon, a principio procurava uma FE ou FM, mas não consegui, algumas poucas no ML mesmo em estado bem ruim estavam por preços muito altos. Neste meio tempo surgiu a possibilidade de algumas Nikkormats de um amigo, mas ela não é o ideal. Se passou mais de um mês e não tinha encontrado ainda então resolvi pagar mais do que estava disposto inicialmente em uma F2 anunciado como quebrada, que quando chegou após uma revisão não muito complicada voltou a funcionar e eu não quero destruir uma câmera funcional para um projeto desses.
Até que finalmente após um novo post no FB aparece uma sucata de F3 e a preço de sucata mesmo haha (Obrigado Eduardo Kholmy).
Esta câmera estava sem o prisma. tela de foco e com problemas eletrônicos então não pesou na consciência desmontar.
A F3 é relativamente moderna e com isso achei meio complicada de desmontar, que bom que eu não tenho que montar ela de volta pois devo ter perdido alguns parafusos e estragado alguns flexíveis no processo.
Aqui cheguei ao chassi e a parte do transporte do filme.
O conjunto do obturador sai completo em uma peça só, porém sem ele a haste que faz o transporte para as engrenagens na parte inferior da câmera fica solta e tive que desenhar uma peça para fixar.
Uma parte que achei que seria mais difícil para alguém sem muitas ferramentas é cortar a câmera, mas tanto o frame como a parte frontal foi relativamente fácil, sem esforço apenas com serra manual e algumas limas para acertar os cantos.
Agora já tinha o básico e faltava montar o quebra-cabeça para fechar todo o resto da câmera. Basicamente são 3 peças, uma para o topo, uma para a frente com o monte da lente e um túnel.
Foi nesta fase que pensei na possibilidade de integrar um rangefinder e até procurei algumas sucatas mas o único que consegui foi o de uma Olympus XA. Apenas como exercício eu cheguei a conseguir linkar com a lente mas a calibragem seria impossível devido ao bastante curto deslocamento do mecanismos.
Descartada a ideia resolvi ainda manter o visor da XA por ser 35mm é algo próximo ao campo de visão da câmera.
Após uns quatro ou cinco dias trabalhando direto nisso e muito plástico gasto nos protótipos eu cheguei a um ponto onde tudo se encaixava mais ou menos OK.
Estava usando PLA para os testes e pensei em usar PETG para as peças finais devido à resistência extra ao calor, mas não estava tendo resultados de acabamento muito bom com esta marca de filamento que tenho aqui e voltei para o PLA.
Por fim resolvi testar o acabamento com uma película emborrachada em spray, usada geralmente para personalizar rodas ou peças de carros e motos, e é conhecido no mercado internacional como “Plastdip”. A ideia aqui é um acabamento melhor e também deixar toda a parte interna da câmera fosca evitando possíveis reflexos.
Eu achei que funciona muito bem uma vez que diferente de metais onde sai com muita facilidade, no PLA teve uma aderência muito boa. A seguir mostro algumas fotos do processo de montagem…
Além do spray ainda usei uns pedaços de EVA e fita isolante líquida o que foi muito útil para vedar algumas pequenas fendas.
Apesar de várias versões ainda tive que recorrer ao bom e velho ferro de solda para derreter alguns locais e moldar para um encaixe melhor :D
O foco funciona por estimativa e com a ajuda de em um despolido eu fiz marcas de 1m até infinito.
Feito isso o próximo passo foi garantir que não existe vazamento de luz, com a câmera montada coloco uma tira de filme de raio-x dentro e exponho a luz do sol em vários ângulos, mas sem abrir o obturador.
No primeiro teste não deu certo e notei que tinha esquecido de alguns detalhes mas foi simples de corrigir e logo a câmera estava totalmente vedada de luz externa.
A seguir chegou a hora de testar com filme de verdade para verificar se o espaçamento entre quadros está bom. O avanço funciona com duas puxadas o que para uma área de 24x70 é suficiente. Esses são os resultados filme Kodak TX400, porém ainda na lente com haze por isso o visual embasado nas fotos.
Tudo Ok até aqui então é hora de correr atrás de resolver o problema da lente, eu poderia mandar o elemento frontal para uma restauração envolvendo polimento ou comprar outra. Analisando as possibilidades cheguei a conclusão que era mais econômico uma nova lente e após alguma pesquisa e negociação achei outro kit C330 contendo a 65mm. Quando este novo equipamento chegou apenas troquei o elemento frontal e agora finalmente estava pronta para mostrar a verdadeira qualidade de imagem possível. Aqui uma exposição de 3 segundos em filme de Raio-X
Então após anos de experimentações e alguns meses trabalhando efetivamente posso finalmente apresentar o meu projeto mais ambicioso até agora, a Rod’s F3Pan, uma câmera panorâmica 35mm totalmente mecânica.
Aqui uma comparação de tamanho com uma Canon F1 + 20mm F2.8
-O Uso-
A câmera tem uma forma de uso bem peculiar e é necessário seguir uma sequência de operação disciplinada. O avanço dos quadros não tem uma trava, e a chance de dupla exposição ou quadros em branco é bem grande se não prestar atenção. O foco é por estimativa se baseando em marcações pré-definidas (1, 2,3, 5 metro e infinito). A velocidade e abertura são controlados na lente assim como o disparo. Para enquadramento no visor possui umas máscaras para deixar o formato panorâmico, é algo aproximado e não totalmente preciso, mas assim também é qualquer rangefinder e estou acostumado. Possivelmente farei um vídeo em breve mostrando melhor como funciona. -Resultados-
Ainda estou relativamente limitado a sair de casa apenas quando bastante necessário e não tive tempo usar a câmera fora, mas em breve devo ter umas fotos externas com o MovieStill. Os exemplos abaixo foram feitos usando Kodak Vision2 50D
Focar em assuntos próximos usando estimativa ainda é um desafio e requer mais treino pois mesmo em f5.6 a lente possui uma profundidade de campo muito estreita. -Agradecimentos e referências-
Gostaria aqui de agradecer a todos os pioneiros que fizeram algo parecido antes de mim, especialmente a Freeman Lin que além do post mostrando em detalhes como fez ainda me ajudou com conselhos muito úteis durante a escolha do corpo e outras dúvidas. Obrigado também a Eduardo Kholmy por me vender a preço de custo o corpo da F3 e ao João Pedro pela doação da XA para um outro projeto de conversão de lente mas o visor acabou sendo bastante útil. Abaixo deixo os nomes e links de todos os projetos que me inspiraram e podem ser muito úteis para outros que desejem construir algo parecido. - Freeman Lin
- Kwanghunhyun also here
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